À guisa de um preâmbulo: estamos vivendo tempos de profundas especulações e perguntas teológicas. Tempos difíceis. Sem dúvida alguma se fossemos convidar pastores que viveram nas décadas de cinquenta e sessenta para tomarem assentos nas reuniões convencionais atuais, ler atentamente os livros que esboçam assuntos pentecostais do momento e tomarem parte de comitês de evangelismo explosivo carismáticos em nossas arenas, certamente veríamos um a um saírem de cabeça baixa. Tempos trabalhosos! Mas a pergunta surge: o evangelho não é o mesmo? Os tempos não são os mesmos? Os reinos da luz e das trevas não são os mesmos? Sim, são! Mas os homens mudaram, e mudaram para pior!
O desequilíbrio de um equilíbrio: em ciência política como na teologia existem os famosos três; naquela, os da direita, os da esquerda e os do centro; nesta, as linhas de pensamento conteporânea, moderada, e conservadora. A sagrada doutrina do dízimo não ficou fora deste pêndulo. Aqueles que defendem a Linha de Pensamento Conservadora (os formalistas), possivelmente temerosos de perderem os membros de suas igrejas, ou denominações, afirmam que o dízimo foi coisa do passado, coisa da Lei. Os que defendem a Linha de Pensamento Contemporânea (os liberais), fugindo dos princípios básicos da hermenêutica bíblica, afirmam ser o dízimo o requisito da lei para manter minimamente o sustento sacerdotal. Eles afirmam: “não estamos debaixo da lei e sim da graça, debaixo da medida bem sacudida e bem recalcada.“ O dízimo para eles é figurativo na quantia e na virtude: o dízimo pode ser dez, vinte ou cinquenta por cento da receita, do tempo ou dos talentos individuais, dependendo sempre quem seja o recipiente! Entretanto, os que aceitam a Linha de Pensamento Moderada (os fundamentalistas), entendem que a virtude do dízimo está na fidelidade da sua contribuição e do seu valor biblicamente estipulado. E sabem eles, que, sendo os crentes obedientes à Palavra, Deus os fará prosperar materialmente e espiritualmente. E desta prosperidade, ele dará livremente os dízimos sagrados e contribuirá com as ofertas alçadas para o engrandecimento do Reino de Deus e a propagação do Evangelho.
A Linha de Pensamento Conservadora: temerosos de ensinarem e praticarem a doutrina bíblica do dízimo, esboçada em Malaquias 3:10 — “Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na minha casa...”; alegam que este ensino foi restrito à época vetero-testamentária. Mas esquecem eles que o próprio Jesus em uma de suas mais brilhantes defesas da justiça, da misericórdia e da fé, colocou as coisas em seus devidos lugares, quando disse: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Pois que dizimais a hortelã, o endro e o cominho, e desprezais o mais importante da lei, o juízo, a misericórdia e a fé; deveis fazer estas coisas, e não omitir aquelas” (Mateus 23:23). A justiça, a misericórdia, a fé e os dízimos são importantes na doutrina cristã — uns mais outros menos! Nenhum deles devem ser omitidos!
A Linha de Pensamento Contemporânea: depois da década de sessenta, os anos das grandes mudanças de costumes e doutrinas da igreja ocidental, tenho contemplado horrores na manipulação dos fiéis quanto à contribuição para a obra do Senhor. Uns assolapam os crentes com intimidações tais que os deixam apavorados, pensando que já estão condenados por pecados imperdoáveis; outros, com chicotes e anestésicos prometem aos leigos cura interior, uma melhor família, carro e casa nova, retorno dobrado do investimento. Nesta guerra atroz e apelação insane por parte dos exploradores de recursos financeiros das igrejas, muitos têm perdido fundos da bolsa de valores, casas, jóias e amigos — tudo em nome de Deus, e escudados no Dízimo Sagrado! Entretanto, outros vão mais a fundo do abismo, e, à guisa de uma nova revelação, trazem doutrinas infernais afim de amedrontarem os crentes, colocando-os em verdadeiras camisas de força:
A maldição hereditária: os pregadores da Confissão Positiva afirmam que um indivíduo que tenha problemas com adultério, álcool, pornografia, câncer ou crise financeira, os têm porque ele herdou de algum antepassado que teve problemas nestas áreas, ou pela negligência da devolução do dízimo! Sendo assim, o antepassado passou aquela maldição, como que por genes espirituais para seus descendentes. Por isso, continuam eles, o descendente deve pedir ajuda ao Espírito Santo para lhe revelar em quem a maldição teve início, afim de pedir perdão pelo antepassado, voltar a depositar o dízimo no tesouro da igreja ou nas mãos de um ministério, e ter a maldição quebrada. Imagine só! Estão ou não, os portadores de colarinhos clericais evangélicos, à dispeito de uma barata mercantilização, típico da igreja ocidental, inconscientemente trazendo para o seio do Cristianismo imaculado a prática transcedente do Budismo, do Hinduísmo e do Espiritismo?
O texto bíblico mais utilizado pelos propagadores desta doutrina é o de Êxodo 20:4-6; Ml 3:10 e Joel 2:25-26, onde Moisés escreveu sobre o mandamento que condena a prática da idolatria; Malaquias admoestou ao povo para não serem negligentes quanto ao dízimo; e, Joel trouxe uma mensagem tônica ao arrependimento. É bom notar, portanto, que os textos em epígrafe falam de idolatria e não de adultério, câncer ou qualquer outra enfermidade; de fechamento das janelas dos céus, em represália à negação do dízimo por parte do povo de Deus, não de espíritos imundos invadindo sua terra; de liberação de praga de gafanhotos sobre suas plantações e não do assédio de legiões de demônios para destruir as propriedades, saúde ou vida espiritual do povo de Deus! Tão pouco oferece nenhuma base para a doutrina de transmissão hereditária de maldições. Entretanto, e por outro lado, sabemos, pela lei da semeadura estabelecida por Deus (Ex 20:5; Gl 6:7), que, sempre quando desobedecemos a sua Palavra, somos objetos do efeito desse pecado; mas quando nos arrependemos, somos agraciadamente livres de qualquer maldição! Estas verdades já foram preconizadas pelos profetas no Antigo Testamento, quando afirmaram: "Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos se embotaram... nunca mais direis este provérbio... Eis que todas as almas são minhas... a alma que pecar, essa morrerá" (Ez 18:2-4); "De maneira que cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus" (Rm 14.12). Novamente, aqui, a lei da recíproca é verdadeira: Ezequias foi um homem temente a Deus, e seu filho Manassés, um pueril idólatra; Acaz foi um abominável rei, mas isso não fez de Ezequias, seu filho, um idólatra ou pecador abominável, mas um temente a Deus!
O profeta Joel em evidência: o texto de Joel 1:4 — “O que ficou da lagarta, o comeu o gafanhoto, e o que ficou do gafanhoto o comeu a locusta, e o que ficou da locusta o comeu o pulgão” — é o preferido para a nova doutrina dos interesseiros nas despensas dos crentes. Fugindo às raias da doutrina bíblica, e num argumento que Deus lhes deu uma nova revelação, uma nova unção e uma nova visão, amedrontam os crentes leigos, afirmando que os gafanhotos referidos na mensagem profética de Joel são exércitos de demônios ferozes, anjos caídos que estão ao derredor dos que não dizimam para destruírem sua paz, sua família e seus bens, e que o único poder capaz para repreender estas hostes, chama-se o dízimo! Simplesmente uma medíocre e interesseira forma de interpretar um texto riquíssimo em história e profecia! Os três únicos capítulos do livro de Joel estabelecem um resumo do passado, presente e futuro de Israel: um passado de fracassos, um presente de dores e um futuro de vitórias. Nesse passado de fracasso, Deus instigou ao povo com várias pragas a fim de se arrependerem da sua nefasta ingratidão — tinham templo novo, cidade reconstruída, terra frutífera, novo horizonte na preparação do advento do Messias — mas o povo sentou-se a comer, a beber e a folgar. Uma das maldições seria que as suas plantações seriam destruídas por uma praga de gafanhoto afim de que se acabasse o vinho das suas festas; a comida das suas glutonarias e a paz para os dias de profundo sono e preguiça nacional! O terrível instrumento de punição seria o gafanhoto, segundo havia profetizado Moisés (Dt 28:38,39) — um inseto provido de aparelho bucal mastigador, asas dobradas longitudinalmente e pernas posteriores mais desenvolvidas, adaptadas para seu tradicional salto — em seus quatro estágios de vida: lagarta, pulgão, locusta e gafanhoto:
- Lagarta – palmerworm – gazan, é o primeiro estágio do gafanhoto em si, recém saído do ovo, no seu perfil embrionário, o qual, pelo processo acidulante suga as proteínas das folhas das plantações, deixando-as enodoadas e ressequidas.
- Pulgão – caterpillar – hasic, é o segundo estágio desse bonito, mas perigoso herbívoro, que mudando sua casca começa lentamente comer as primeiras polpas das folhas das plantações.
- Locusta – cankerworm – yelek, é o terceiro estágio da metamorfose do gafanhoto, no qual suas pernas e pequenas asas já aparecem e, pulando de folha em folha, já pode fazer um grande estrago, comendo as folhas de cada planta, deixando apenas isenta seus tentáculos.
- Gafanhoto – locust – arbeh, é o quarto, último e perigoso estágio do que nós conhecemos como gafanhoto, tendo já uma pele nova, as pernas firmes e asas desenvolvidas. E, em exército, eles pulam e voam em alta velocidade, e sua capacidade devoradora das folhas, flores e tentáculos é de incomensurável poder.
A Linha de Pensamento Moderada: sem nenhuma pretenção, mas desejando apenas testemunhar da prática honrosa do dízimo, é que, durante os meus 50 anos de vivência com as Assembléias de Deus, tenho presenciado os humildes trabalhadores e pobres viúvas trazerem seus dízimos aos cultos de Santa Ceia; tenho visto os pastores de pequenas igrejas do interior dizimarem fielmente daquilo que amoravelmente lhe ofereceram; tenho observado que irmãos ricos, não tendo como contabilizar seus lucros mensais, lançarem mãos de sua renda anual, dividir por dozes, e entregarem o dízimo no culto mensal de doutrina de sua igreja local. Sem murmuração ou questionamento, todos felizes por obedecerem à Palavra de Deus. Os crentes tidos como moderados aceitam que a virtude do dízimo está explicitamente na fidelidade da sua contribuição e do seu valor biblicamente estipulado. Sabem eles, que, sendo obedientes às Escrituras, Deus os fará prosperar materialmente e espiritualmente. Desta prosperidade, ele dará livremente os dízimos (Lv 27:30-32; Dt 14:23; Ml 3:10; 2 Cr 31:6; Mt 23:23 e Hb 7:9) e as ofertas (2 Co 16:2) para o engrandecimento do Reino de Deus aqui na terra:
Historicamente mesmo antes da lei, existiram homens de Deus como Abraão, que entregou o dízimo a Melquizedeque, como sinal de agradecimento e temor a Deus (Gn 14:20); Jacó pagou seu dízimo em agradecimento a sua viagem à Pandarã (Gn 28:22); na época dos juizes, Samuel que na sua velhice, instruiu ao povo para dizimarem da agricultura e dos animais (2 Sm 8:15-17); e no período do Novo Testamento Jesus que aprovou e instruiu que dessem o dízimo (Mt 23:23; Lc 18:12).
O dízimo tem a finalidade de manter a obra do Senhor e os que em tempo integral labutam nela — “para que haja mantimento em minha casa”. Nos tempos contemporâneos de Joel e de nosso Senhor Jesus Cristo, o povo entregava esta percentagem em víveres para sustento dos sacerdotes, dos levitas e manutenção do templo e seus pertences (Ml 3:10,11; Mt 23:23; Hb 7:8,9). Neste presente Século de desenvolvimento, entretanto, os crentes entregam dez por cento da sua renda bruta (deduzidos dela apenas o seguro social), suas ofertas alçadas, os quais são utilizados no sustento pastoral, na compra de edifícios, na manutenção das instalações, no envio de missionários e no apoio de programas de ensino acadêmico e congregacional, evangelístico e assistência social.
No tempo presente os crentes sentem-se na obrigação de obedecerem à Palavra de Deus. Portanto, o primeiro princípio que leva os crentes a dizimarem é o da obediência às Escrituras Sagradas, uma vez que ela é norma de conduta e fé de todos cristãos; o segundo, é o do reconhecimento, em saber que somente Deus, e unicamente ele, é responsável pelo sol e a chuva, pela água e a terra, pelo crescimento e frutificação de todos os pomares do mundo; e o terceiro, é o do agradecimento, em saber que não merecíamos nada, e ele nos deu tudo! Não dizimamos para sermos abençoados, o fazemos porque já o somos; não dizimamos para fazermos pseudos negociatas com Deus, porque ele é santo e seu povo também o é; não dizimamos temendo que nenhuma legião de demônios venha nos atacar, porque delas Deus dará ordem aos seus anjos para nos proteger!
As Coisas devem ser chamadas como são! A entrega do dízimo é uma obrigação imperativa do crente — “trazei todos os dízimos” (Ml 3.10); a oferta alçada, uma obrigação voluntária — “cada um de vós ponha à parte o que puder ajuntar” (2 Co 16:2):
Os gafanhotos do texto de Jl 1:4 e Dt 28:38 não são quatro tipos diferentes, e sim, quatro fases distintas de metamorfose do inseto ortópteros. As quatro fases dos gafanhotos do texto do profeta Joel não se referem a demônios, nem na interpretação literal ou simbólica das Escrituras. Destarte, em lugar nenhum da Bíblia há evidências que os gafanhotos sejam demônios incorporados, ou que estes tenham domínio sobre o povo de Deus, quando ela mesma afirma que “o pecado não terá domínio sobre vós”; que “as armas da nossa milícia não são carnais, mas sim poderosas em Deus, para destruição das fortalezas”; porque maior é o que está em vós do que aquele que está no mundo”; e, finalmente, ela nos exorta que devemos nos submeter a Deus, resistir ao diabo, “e ele fugirá de vós” (Rm 6:14; 2 Co 10:4; 1 Jo 4:4; Tg 4:7). Entretanto, quando Deus quer privar o crente de qualquer bênção, ele ordena ao céu para que retenha a chuva; ordena às árvores que não produzam; a Faraó que endureça o coração; aos gafanhotos que comam os frutos das plantações; e que o pneu do carro do irmão negligente no dízimo, baixe em plena estrada alfaltada. Porque todas as coisas contribuem para o bem daqueles que amam a Deus (Rm 8:30)!
Não existem bases bíblicas nem históricas para a alocação de certas hierarquias angelicais da maldade aos governos, às regiões geográficas ou à agrupamentos demográficos. Certo é, que o gerenciamento dos anjos caídos é responsabilidade de Satanás, que seu reino está prestes a se dividir e ruir, que todos serão julgados por Cristo e a Igreja glorificada, e que por fim, serão lançados no inferno. Nada mais nada menos interessa aos cristãos — “As coisas encobertas são para o Senhor nosso Deus; porém as reveladas são para nós...” (Dt 29:29)!
Não existem qualquer inferência bíblica que designe a classificação angelical de Efésios 6:12 — “Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas sim contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais” — como sendo responsável por determinadas escalas de maldições, como se Deus tivesse uma subordinação administrativa à estes espíritos imundos! É bom sempre lembrar que onde está o cadáver ai está as aves rasteiras! Deus abre portas, Deus fecha portas. Ele é soberano! Chegou o tempo de cuidarmos com a proliferação irresponsável das chamadas nova unção, nova revelação e nova visão. Existe apenas uma unção, a do Espírito (1 Jo 2:27); uma revelação, a de Deus ( 1 Co 2:10); uma visão dos campos brancos, a de Cristo (Jo 4:35)! E elas são tão antigas quanto a eternidade (Hb 1:14; Sl 119:89)!
Últimas palavras: agradeço a Deus pelos dons, ministérios e salvação, dádivas exclusivamente dele, entregues a todos os fiéis, independentes da fachada denominacional, gráu social, etnia ou nacionalidade. Ele é bom! Agradeço a todos que tomaram seu precioso tempo para ler este opúsculo, sei que se não fizer bem, mal não há de fazer! Finalmente, tome atenção aos seguintes pontos práticos dos dizimistas:
Todos os crentes que falham no pagamento do dízimo sentem suas consciências abaladas. Fato este estimulado pelo Espírito Santo, oriundo da desobediência à Palavra de Deus. Quando o crente decide voltar a entregar o dízimo, se não instruído ao contrário por Deus , ele não necessita prestar contas dos montantes passados. O processo original de desobediência foi perdoado, recomesse e seja abençoado!
Os dízimos são entregues às igrejas legalmente constituídas — à casa do tesouro. Indivíduos, ministérios, agências e escolas, não são igrejas, são partes dela. Qualquer oferta designada pode ir aos cofres de quaisquer pessoas ou grupos, mas o dízimo, exclusivamente à casa do Senhor. Os crentes são orientados a entregarem seus dízimos na igreja que ele frequenta, que ele é membro — “Trazei todos os dízimos à casa do tesouro” — é como que alguém comesse no Burger King e fosse pagar o sanduiche ao Mc Donald!
Todos os crentes são estimulados a entregarem seus dízimos (dez por cento da renda bruta, após descontados os impostos de seguros sociais), seja ele batizado ou não, membro aderente ou efetivo daquela igreja — “Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na minha casa...” (Ml 3:10). Os pastores de tempo integral ou não, são compelidos a pagarem o dízimo, o que as Escrituras se referem como dízimo do dízimo — “Quando receberes os dízimos dos filhos de Israel, que eu deles vos tenho dado em vossa herança, deles oferecereis uma oferta alçada ao Senhor; os dízimos dos dízimos” (Nm 18:26; Ne 10:37).
A teologia do dízimo é muito clara: trazei o dízimo do cominho, dos animais, do endro, da farinha e de quantias numerárias. O dízimo provém de coisas materiais para sustento material da obra do Senhor. Portanto, o dízimo não é do tempo, do intelecto, da pessoa ou da família, pois estes já pertencem todos a Deus (1 Pe 1:18; Rm 8:16 e Ap 21:3). Deus seja louvado!
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